sábado, 28 de dezembro de 2013

Em processo



Madrugada trabalhando nos estudos para uma nova vinheta, que provavelmente será em recortes. Na foto, do lado direito, minha truquinha com algumas amostras de recortes em teste, e no lado esquerdo um teste para o personagem. Abaixo da folha amarela, o livro do Modern Dog, sempre uma referência. Em frente :)

Referência: Zbigniew Rybczynski


Conheci esse mestre da manipulação da imagem nas aulas na Escola de Audiovisual, aqui em Fortaleza, e de cara já me impressionei muito com seus trabalhos. Zbig - para os íntimos - é um realizador polonês que experimenta pra valer, e embora eu reconheça que conheço quase que apenas o seu trabalho dos anos 70 aos 90, o que eu vi me marca um bocado, tamanho o leque de possibilidades que ele explora, e os resultados que conseguiu em cada trabalho. A animação em si, isto é, o trabalho com imagens quadro a quadro é "apenas" uma das vertentes que ele trabalha, mesclando ainda live-action, computação gráfica, composição digital desde tempos que nem se falava muito sobre isso. Abaixo, uma pequena amostra de alguns dos principais trabalho do homem:




(ordem dos trabalhos:)

- KWADRAT (Square) - 35mm short film, 4:40, PWSTiF Lodz, Poland
- TAKE FIVE - 35mm short film, 3:36, PWSTiF Lodz, Poland
- NOWA KSIAZKA (New Book) - 35mm short film, 10:26, SMFF Se-Ma-For Lodz, Poland
- ZUPA (Soup) - 35mm short film, 8:22, SMFF Se-Ma-For Lodz, Poland
- MEDIA - 35mm short film, 1:36, SMFF Se-Ma-For Lodz, Poland
- OJ! NIE MOGE SIE ZATRZYMACI! (Oh, I Can't Stop!) - 35mm short film, 10:07, 
SMFF Se-Ma-For Lodz, Poland
- MEIN FENSTER (My Window) - 35mm short film, 2:26, Vienna 
- SWIETO (Holiday) - 35mm short film, 9:38, SMFF Se-Ma-For Lodz, Poland
- TANGO - 35mm short film, 8:14, SMFF Se-Ma-For Lodz, Poland

Alguns dos meus favoritos:

Tango é uma colagem incrível de pequenos 'movimentos' - na falta de termo melhor -, compostos numa única cena. A complexidade e elaboração necessárias para se fazer algo do tipo numa era pré-composição digital é algo que quase me dá mal estar só de se pensar. Não sei exatamente como o filho da mãe fez, mas certamente foi algo próximo à colagem quase frame a frame de cada personagem, em sincronia perfeita com todo o restante. É o tipo de animação, ao meu humilde ver, ideal: tão interessante de se ver que sempre se nota algo novo; um filme que nunca se repete, sempre surpreende.



Oh, I Can't Stop! é um pixilation e time lapse ao contrário: ao invés das pessoas se mexerem em relação à câmera - que normalmente é parada nas técnicas que citei -, é a câmera que se mexe, simulando algo como um monstro que passa por uma cidade da Polônia e consome tudo em seu caminho. Assim como o Tango, irresistível de se assistir, hipnotizante.



Filmes como esses (de realizadores que realmente acreditam no que fazem) nos trazem, acredito, algo que bom quando assistimos, quase - aliás, quase não, com certeza - nos colocando em contato direto com suas mentes. Sempre me sinto dialogando com eles, como que trocando ideias, sobretudo ao decorrer dos anos, conforme cresço e - espero eu - me desenvolvo e também o meu trabalho, e os filmes parecem reforçar ideias, falar coisas novas; ao mesmo tempo que se mantém clássicos pessoais, se renovam. E vamos em frente.

terça-feira, 10 de dezembro de 2013

II Mostra Itinerante de Cinema do Ceará



Entre 10 e 17 de novembro de viagem da II Mostra Itinerante de Cinema do Ceará, onde tive a honra de fazer parte da equipe que em oito dias percorreu quatro cidades do nosso estado - Icapuí, Aracati, Fortim e Jaguaruana - realizando exibições e oficinas. Foi uma experiência incrível. Como em toda viagem que tenho feito, parte é trabalho, ou o nosso 'objetivo' principal mas (grande) parte é aproveitar um novo lugar - ou novos lugares - na sua essência, conhecendo coisas, pessoas e desfrutar de uma sensação, quase como um cheiro, um aroma, próprio de cada espaço diferente do nosso que encontramos.

Eu e o rio Jaguaribe. (foto de Grá Dias)


A Mostra então contava com a exibição de filmes propriamente dita - uma seleção do cinema cearense com vários estilos, abordagens, linguagens e momentos da nossa produção - e de duas oficinas:  Realização de Documentário, (ministrada por Sabina Colares, que também foi responsável pela curadoria dos filmes exibidos na mostra) e animação, que ministrei com a assistência inestimável do parceiro e amigo Josimário Façanha. Ainda tive meu trabalho Linhas e Espirais exibido na mostra, o que foi um ótimo bônus pra mim, ter meu trabalho nesta seleção tão bacana.
Uma coisa bem bacana foi que o evento foi largamente documentado através do Cine Jornal,  um vídeo documentário que mostrava todas as nossas ações em cada cidade, e que era exibido no segundo dia em cada cidade. Foi muito interessante ver, tanto nos vídeos de resultado das oficinas quanto nos cine jornais, a população local refletida na tela.
Nossa equipe era ainda composta por David Aguiar, Helton Vilar, Canindé, Adriano Lima, Djaci José, Grá Dias, Janjão, e na montagem da tela e projeção, Ricardo e Márcio. Como falei antes, percorremos quatro cidades - Icapuí, Aracati, Fortim e Jaguaruana, nesta ordem -, ficando dois dias em cada, realizando as oficinas e a mostra de filmes. Abaixo um pouco de tudo o que vivenciei nestes dias tão bacanas.


Icapuí - Praia da Redonda


Josimário dando uma volta na Praia de Redonda, em Icapuí.
Na primeira cidade da nossa itinerância, tanto Mostra de Filmes como oficinas foram ministradas na Praia da Redonda, onde também ficamos hospedados. A oficina de animação aconteceu na Pousada Oh! Linda, com os alunos do projeto Um Toque de Criança, que ensina música para crianças e jovens.

Alguns dos alunos na oficina em Icapuí.
A oficina foi de stop motion com objetos, e a premissa básica foi trabalhar apenas com objetos encontrados nos arredores, e em cima destes objetos criar pequenas cenas animadas e criar um filme coletivo.


Alguns dos objetos encontrados pelos alunos e usados nas suas animações.
Os alunos, cujas idades variavam entre 8 e 13 anos rapidamente entraram no espírito da oficina e, usando apenas estes objetos conseguiram criar cenas muito bacanas. O fundamental era que percebessem exatamente isso - que podem animar usando qualquer coisa, e criar trabalho muito bacana sem precisar de fato de muita coisa.


Truquinha armada e pronta pra começar!


Alunos em ação animando. Tentava interferir ao mínimo nas suas ideias, apenas direcionando quando necessário e os ajudando a obter da melhor forma aquilo que pensaram.


O momento exato em que vêem suas criações animadas e ganhando vida - este sorriso genuíno (que confesso partilhar cada vez que vejo algo que animo) com certeza é uma das melhores coisas de se dar oficinas de animação...
Na segunda parte da aula trabalhamos apenas com animação com areia - recolhida ali do lado (nada como animar na praia!) -, que pedia uma nova abordagem, e que os alunos aos poucos foram entendendo como funciona.


Josimário explica a um dos alunos como manipular a areia.



E abaixo, o filme finalizado, e também o Cine Jornal mostrando como foi tudo por lá.





A finalização, edição e som dos filmes de animação dos alunos, assim como a edição dos Cine Jornais da Mostra foi de Helton Vilar.

Agradeço a Simão Pedro Dantas, coordenador do Projeto Um Toque de Criança, uma das pessoas que tornaram possível a oficina acontecer.

Uma manhã nublada num dos dias que passamos na Praia de Redonda.

Aracati - Comunidade da Volta

Um dos locais na Comunidade da Volta onde realizamos as oficinas. (Foto da produção da Mostra)
Os processos como um todo eram bem rápidos, então o nosso esquema básico era: chegar na cidade, ir direto pra oficina, dar aula manhã e tarde, e à noite exibição da Mostra. Segundo dia, oficina de manhã, tarde para fechar o filme da oficina, e à noite deste dia, apresentar os filmes das oficinas, entregar os certificados dos alunos, e na volta pra pousada arrumar as malas para sair cedo no outro dia pra próxima cidade. Tínhamos pouco tempo para "descansar", mas o processo todo era muito bacana de participar, extremamente empolgante. Claro, cada membro das outras áreas da equipe tinha outros horários, mas girávamos em torno desses pontos gerais e a itinerância seguiu em frente.

Chegando em Aracati, ficamos na Vila da Volta, uma comunidade nos arredores de Aracati, e nos hospedamos na Cama Café, um simpático sítio transformado em pousada, que faz parte da Rede Tucum, que habilita moradores de diversas regiões que não tem hotéis ou pousadas a transformarem suas casas em hospedagens. Ficamos aos cuidados de Dona Menininha, Seu Santos e suas filhas que nos receberam muito bem.
Cama Café, onde tivemos nossa agradável estadia (Foto de Helton Vilar)


Mas como eu dizia antes, chegamos mesmo direto pra oficina. Eu e Josimário montamos a truquinha (ver lugar pra posicionar, colocar base, encaixar estrutura em metal, desembalar tudo da mochila, encaixar câmera, cabos, posicionar extensão, ligar computador e iniciar o Dragon Frame - programa para captura de stop motion que uso -, verificar enquadramento e foco e voilá) e começo a aula. No primeiro momento, conversamos sobre o que todos conhecem de animação, e daí puxo para o tipo de animação que vamos fazer. Os alunos iniciaram animando com objetos que estivessem com eles, e no período da tarde passamos para objetos que encontrassem nos arredores.

Eu explicando como funciona a truca, nos primeiro horário de aula (foto da produção da Mostra)
Um dos estudos iniciais desenvolvidos pelos alunos na parte da manhã (foto da produção da Mostra)
Já animando, os alunos compuseram uma perna que chuta uma bola, feita de um cordão de metal e uma tampa de garrafa plástica.
Uma tampa de garrafa de plástico e um palito de picolé se tornam um helicóptero, e um pedaço de cano uma torre nesta cena de um grupo de alunos.



E o helicóptero se aproxima de uma torre - representada por um pedaço de cano - e a leva para longe.

No dia seguinte assistimos a referências de filmes feitos de forma semelhante, tanto trabalhos meus como de outros realizadores, daqui e de outros países. Após termos todas as imagens captadas, Helton tratou as imagens, editou todo o material, adicionando ainda algumas cartelas, música e efeitos sonoros e o resultado, que exibimos no segundo dia à noite, pode ser visto abaixo, e também o Cine Jornal mostrando como foi tudo em Aracati.





Meus agradecimentos a Francisco José, animador e membro do ANIMARACA - Núcleo de Animação de Aracati, que nos deu todo o suporte durante a oficina.

E algumas das imagens do encerramento, na entrega dos certificados aos alunos, antes da exibição do filme final.



(fotos da produção da Mostra)


Fortim e Pontal de Maceió



A visão acima era a que tínhamos do lugar de onde almoçavamos e jantávamos em Fortim. Uma cidade pequena e agradável, em volta do rio Jaguaribe. Abaixo, a visão do parapeito da nossa pousada.


E nossa oficina aconteceu no distrito de Pontal de Maceió, pela primeira vez na itinerância com toda a turma acima de 14 anos na oficina de animação. Mais uma vez usamos o mesmo esquema, animar com objetos que se encontram com você, e à tarde com obejtos que encontrássemos nos arredores.

Explicando o funcionamento básico da truca (foto da produção da Mostra)
(Foto da produção da Mostra)

Aluno animando seu cordão.


Desta vez decidimos dar um tema para os alunos trabalharem, além de lhes pedir para elaborarem suas ideias num pequeno roteiro (nada elaborado, só alguma ideias em sequência). O tema foi o lobisomem, pois já desde Aracati ouvíamos as histórias do lobisomem, e soubemos que em Fortim a lenda é ainda mais forte, então, por que não? Foi bastante divertido trabalhar desta forma, as coisas fluiram de forma muito interessante e tivemos ótimas cenas realizadas.

Personagem - composto de pedaços de metal, pregos e parafusos - está na floresta,  quando o lobisomem aparece.

Como em Aracati, animamos apenas com a luz oriunda de baixo, na mesa de luz, deixando os obejtos em silhueta ou transparência, valorizando a forma e a estilização dos elementos.
 E um complemento bacana desta oficina foi uma aula de edição que tivemos com o nosso editor - que também era um dos diretores da Mostra -, Helton Vilar, que mostrou cuidadosamente todos os processos que fizemos com as imagens captadas - dos ajustes gerais e tratamento de cor até a edição do material inteiro.




E no encerramento, apresentamos a sessão, os alunos receberam seus certificados, falaram um pouco da experiência e tivemos a segunda parte da sessão de filmes.


Eu falando da experiência da oficina em Fortim (foto da produção da Mostra)
Djaci José, nosso produtor, abrindo a nossa apresentação (foto da produção da Mostra)

Aryane, uma das nossas alunas mais dedicadas, falando da sua experiência na oficina (foto da produção da Mostra)


Alunos da oficina de animação com seus certificados (foto da produção da Mostra)

E abaixo, o filme de animação da oficina e o Cine Jornal de Fortim. Desta vez montei uma música para o filme dos alunos :)





Meus agradecimentos ao prof.: Fernando, exemplo de dedicação à comunidade e ao crescimento cultural dos alunos, jovens e adolescentes da região, e às professoras Neurinha e Vânia, pelo apoio durante a oficina.

Filme da oficina em exibição (foto da produção da Mostra)
Linhas e Espirais sendo exibido em Fortim (foto da produção da Mostra)

E cedinho do outro dia já estávamos de malas prontas para partir para Jaguaruana. Ao longe, junto ao sol começando a subir, apenas as estações de energia eólica.




Jaguaruana


Público compareceu em peso às exibições. (foto da produção da Mostra)


Jaguaruana, a terra das redes de dormir, é uma cidade super agradável. Na então última cidade da nossa itinerância, nos sentimos todos muito à vontade e mais uma vez pudemos aproveitar bem os dias lá passados. A oficina foi realizada na Secretaria de Cultura do município, e quanto lá chegamos comecei a pensar em fazer algo diferente das cidades anteriores. 


Mostrando um pouco de referências de rotoscopia - no caso, uma vinheta do mestre italiano Gianluigi Toccafondo. (fotos da produção da Mostra)
Dado o perfil dos alunos (de 16 anos para mais), e o fato de que, embora tenha havido muitas inscrições, apenas 5 compareceram, decidi trabalharmos com a rotoscopia. Aproveitando o pensar das oficinas de documentário ministradas pela Sabina (em que os alunos faziam um mapa de coisas interessantes da cidade a se documentar), pensei em fazermos algo como um 'documentário animado', mostrando um pouco das memórias dos alunos, que com a rotoscopia, teríamos o real + animação juntos num trabalho que ficaria bem interessante. Compartilhei esta ideia com os alunos, os quais vi seus olhos brilharem, e isso foi mais do que a certeza de que seria o caminho a seguir, e lá fomos nós. O Cine Jornal desta edição mostra bem detalhadamente como pensamos a oficina, que foi da seguinte forma; após escolher estes locais da cidade que trouxessem lembranças da vida dos alunos, fomos todos em cada lugar e registramos pequenas ceninhas, de alguns segundos cada, que logo depois foram transformadas em sequências de imagens (cada segundo transformado em uma sequência de doze fotografias separadas), e estas impressas e trabalhadas, animando com pintura e desenho sobre cada uma. Em seguida este material foi fotografado quadro a quadro e recomposto na forma das cenas reais, mas com a interferência da animação adicionada. Também trabalhamos com a variante da pintura-no-tempo sobre fotografias, onde uma mesma imagem recebia a interferência de animação, atra'ves de mudanças sucessivas fotografadas quadro a quadro, como aliás podemos ver abaixo, na aluna Luana trabalhando.


Nossa truca contou com uma luz adaptada à sapata da câmera, o que foi uma mão na roda, e já penso nesse esquema para fazermos futuramente na nossa truquinha itinerante.
Josimário prestando assistência à aluna, fotografando conforme ela modificava o frame anterior adicionando elementos.



Nosso esquema era esse: enquanto um aluno animava sobre uma mesma fotografia, os demais iam animando na rotoscopia propriamente dita, trabalhando quadro a quadro criando animações sobre as cenas reais impressas.



As sessões da noite foram feitas numa agradável praça, que contaram com um grande público e bem diverso. Uma das melhores exibições que tivemos na itinerância, foi muito agradável. Tivemos a entrega de certificados e encerramos com a segunda parte dos filmes da mostra.

Parte da equipe, secretário de cultura e alunos na entrega dos certificados.
(fotos da produção da Mostra)
(foto da produção da Mostra)

E segue o filme final realizado com os alunos, e o Cine Jornal. Ah sim, a música do filme de animação é de um músico local, Marcelo Lima, parceiro de Dodó Figueirêdo, cordelista e que também foi aluno da oficina.



Voltamos nesta mesmo noite, após a exibição, e no fim da noite do domingo já estávamos de volta em Fortaleza. E assim foi a nossa itinerância. Oito dias ao total, mas que pareceu um mês tamanha foi a profusão de coisas tão bacanas que surgiram e que fizeram parte de nós na nossa vivência. Belíssimas localidades, pessoas tão interessantes, momentos mágicos que fizeram tudo mais do que valer a pena. Isso é uma das coisas mais legais de se viajar, que é estar com o coração aberto a tudo o que chega e passa a fazer parte de nós, a integrar a nossa vida deste ponto em diante.

Agradeço a todos que cruzaram o nosso caminho e fizeram nossa viagem ser tão especial. Agradecimentos especiais a Telmo Carvalho e ao NUCA - Núcleo de Cinema de Animação da Casa Amarela Eusélio Oliveira / UFC, pelos equipamentos cedidos. E ainda, agradecimentos mais do que especiais a todos os colegas de equipe - Josimário, Helton, David, Sabina, Djaci, Grá, Adriano, Canindé, Janjão, Ricardo e Márcio, pelo apoio, amizade e convivência nessa semana incrível.

De volta ao estúdio, agora apenas a saudade e a vontade de partir para a estrada num projeto como este em breve. Aprendi demais nessa viagem, em muitos aspectos, e coisas como essas ficam pra sempre. E vamos em frente! :)